quarta-feira, 28 de abril de 2010

A uma amiga

Cortam as amarras, deixam os grilhões presos num fino fio.
Andar pesado, estonteante, a cada instante será o último e eterno espaçar numa escadaria que se julgava duradoura.
A noite descai aos pés, banha o ventre que chora convulsamente.
Lágrimas salpicam as diversas mãos que se estendem, não vale a pena, o final poderá estar próximo.
Asas de anjos circundam o corpo que tenta elevar-se, cai e torna a tombar.
Estagna no frio chão, humidade cortante. Invade a alma, o coração.
Desespero angustiante, ferido o coração bate em pequenos compassos.
Talvez um beijo de despedida, não se sabe o que fazer.
A mente bloqueia numa fracção de segundo, deixa ir.
A barca aproxima-se, poderá ser ilusão óptica.
Queremos julgar que sim, não se sabe.
Daremos a moeda ao barqueiro, com sorte apartar-se-á para bem longe.
Seremos o rio que transportará as lembranças e angústias que virão.
Numa quimera passada, éramos a corte que assistia às palavras que jorravam.
Com um mata-borrão, estancaremos a dor, saudade essa não se poderá apagar.
Reinará em nossos olhares e corações.
A partida poderá estar longe, os grilhões deixam de roçar no chão.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Num minuto comete-se a maior loucura, o pecado sem retorno.
Amar durará certamente mais que um segundo, uma eternidade para além do que o relógio pode suportar.
Desenha-se no ar uma sombra, um gemer, um entardecer de corpo suado.
Tudo se evapora, sai com um gesto.
O corpo quer expulsar o sentir, contorce-se e enrola-se em posição de feto.
Choro a metro, ligam o coração ao desejo de pensar sequer em amar, ter em sua boca o doce néctar de um beijo.
Quão obtusa é a vontade do ser, corte transversal numa palavra que se solta.
O amor, desejo?
Não retornam, descai o pendurico que se transporta. Que importam o que pensam, a vontade que se sente ultrapassa limites impostos.
Quem desenhou a linha fronteiriça que distingue o pecado do correcto?
Não se pretende saber, o que cá vai é tão grande que numa mão transbordaria em cascata.
Banho de luar, lânguida é a forma como o corpo retoma na cama que o sustenta.
Num minuto, não importa qual tudo se transforma.
Abraço dos que despem a máscara, a pele. Fardo pesado, acto contínuo.
Correr e ser puta, preencher o vazio nos braços do que se ama.
Puta, porque não?
Existe uma em todos nós, lá vem o conceito de bom senso, hipocrisia dos demais.
Liberdade nem os pássaros a têm, voam muitas vezes para a gaiola que alguém criou.
Fénix que renasceu, de novo os céus ergueu.
Apesar do minuto voar tal qual o pássaro, não se desiste de amar mesmo sabendo que no segundo a seguir as algemas que nos colocaram se apertarão...
27 Abril 2010

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Aparta-se de mim uma sombra, leve frio que percorre cada poro do corpo. Com um simples gesto tento afastar esse sentir, não vai, teima em percorrer-me, deixa-me atordoado, talvez exausto não o sei ao certo.
Perdi a noção do tempo e espaço, seja ele temporal ou físico. Se me falam, não o sei dizer, sei que mexem o maxilar e articulam gestos secos, quase que repetidos, outros partidos pela ignorância e falta de inteligência de quem os diz.
Sentido crítico, malvadez, podereis dizer. Que me importa, que o digam, estou para além do que possais imaginar.
A sombra envolve-se em mim, quase que poderíamos fazer amor eternamente. Ninguém notaria, estão todos absortos em fingir que estão a realizar uma tarefa importante, como são tolos, fúteis.
Ver além do que mostram é um dom, um passo e mágica em que do nada despimos as pessoas.
Não é nudez, pelo menos no sentido lato que quereis dar. Pecadores de mentes, também o sei ser, oh se sei ser admito.
Pequeno aparte, remetemo-nos para a nudez, nudez de espírito.
Nestes momentos em que me deixo ir nestes caminhos do pensamento, poderia deixar o meu corpo onde me encontro e divagar entre o mundo.

Desperto com o cair de uma caneta, alguém que fala mais alto. Todos querem a atenção, a popularidade, a medalha.
No final do dia, levam o vazio que as acompanha. O mesmo vazio que trouxeram quando aqui chegaram, sentem-se contentes, por vezes reis e rainhas de reinados inventados somente nas mentes deles.

A sombra vai se esfumando, espiral que se enrola no chão. Tenta sobreviver, o frio que a banha, a luz que a incomoda. Olho a meu redor, não estou só mas sinto que estou.
Faz-me bem pensar que sim, leve e solto entre palavras aglomeradas na minha boca que saltam para as mãos.
Despejar parte delas em papel faz com que me eleve a um nível do jogo que muitos não atingirão.
Desço à terra, aterro no meio de processos e papelada. Céu e inferno num só termo, visto a fatiota de trabalhador. Espreito a rua que se movimenta em sentidos opostos, azáfama constante.
Frenesim de pessoas atabalhoadas pelo stress que fingem ter, sorriso que se impõe em minha boca.
Fecha-se a página deste capítulo, maçudo ou não, dir-me-á quem lê.
Não me importarei se for aborrecido, redundante, piegas, soube bem…